03/06/2016
Pedido de vista do ministro Edson Fachin suspendeu o julgamento de Habeas Corpus (HC 118533) por meio do qual o Supremo Tribunal Federal (STF) discute se o chamado tráfico privilegiado, previsto no artigo 33, parágrafo 4º, da Lei 11.343/2006, deve ser considerado crime de natureza hedionda. Na sessão dessa quarta-feira (1º), votaram os ministros Gilmar Mendes, que se manifestou por afastar o caráter de hediondez dos delitos em questão, e os ministros Dias Toffoli e Marco Aurélio, que reconheceram como hediondo o crime de tráfico privilegiado.
O tráfico privilegiado prevê que as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa.
No caso concreto, Ricardo Evangelista Vieira de Souza e Robinson Roberto Ortega foram condenados a 7 anos e 1 mês de reclusão pelo juízo da Comarca de Nova Andradina (MS). Por meio de recurso, o Ministério Público conseguiu ver reconhecida, no Superior Tribunal de Justiça (STJ), a natureza hedionda dos delitos praticados pelos réus. Contra essa decisão foi ajuizado, no STF, o HC em julgamento.
O caso começou a ser julgado pelo Plenáruo em 24 de junho do ano passado, quando a relatora, ministra Cármen Lúcia, votou no sentido de conceder o HC. Para ela, o tráfico privilegiado de entorpecentes não se harmoniza com a qualificação de hediondez do tráfico de entorpecentes, definido no caput e parágrafo 1º do artigo 33 da norma. Ela foi acompanhada pelo ministro Luís Roberto Barroso.
Naquela ocasião, o ministro Fachin chegou a se pronunciar pelo indeferimento do pedido, ao argumento de que a causa de diminuição de pena, prevista na Lei 11.343/2006, “não parece incompatível com a manutenção do caráter hediondo do crime”. Acompanharam esse entendimento os ministros Teori Zavascki, Rosa Weber e Luiz Fux. O julgamento foi interrompido, então, por pedido de vista do ministro Gilmar Mendes (foto).
Ao se manifestar na sessão desta quarta, o ministro Gilmar Mendes considerou que a Constituição Federal deu ao legislador espaço para retirar do âmbito dos crimes chamados hediondos algumas condutas de transação ilícita com drogas. Para ele, há casos em que não se pode fugir à hediondez, principalmente quando há habitualidade no delito. O caráter isolado do delito, a inexistência de crimes para além de uma oportunidade, por sua vez, salientou o ministro, autorizaria o afastamento da natureza hedionda do crime.
Já o ministro Dias Toffoli decidiu acompanhar a divergência aberta pelo ministro Fachin. O ministro citou, inicialmente, que no caso concreto os réus foram pegos com 772 kg de droga, em um caminhão escoltado por batedores, um indicativo de que estariam atuando para organização criminosa.
Ao votar pelo indeferimento do HC, o ministro lembrou que, apesar de ser a primeira vez que o Plenário do STF analisa o tema, as Turmas do STF têm assentado caráter da hediondez do tráfico privilegiado.
O ministro Marco Aurélio concordou com o ministro Toffoli. Para ele, o reconhecimento da hediondez foi uma opção normativa, pelo legislador, que partiu da premissa de que tráfico é um crime causador de muitos delitos, para chegar a um rigor maior quanto ao tráfico de entorpecentes.
Crimes hediondos
Além de serem inafiançáveis e insuscetíveis de anistia, graça ou indulto, os crimes hediondos, previstos na Lei 8.072/1990, devem ter penas cumpridas inicialmente em regime fechado, e a progressão de regime só pode acontecer após o cumprimento de dois quintos da pena, se o réu for primário, e de três quintos, se for reincidente.
Dados estatísticos
O presidente do STF, ministro Ricardo Lewandowski, trouxe ao debate dados estatísticos relativos aos resultados já alcançados a partir da implantação das audiências de custódia, mas que, nas palavras do presidente, ainda se mostram insuficientes para resolver o problema do sistema carcerário brasileiro. Mantida a proporção e o ritmo do encarceramento que temos hoje no país, disse o presidente, dentro de poucos anos alcançaremos o número de um milhão de presos. Para Lewandowski, é preciso se chegar a uma solução de natureza de política criminal. Nesse sentido, o ministro salientou que uma decisão voltada a conceder o HC no caso em julgamento, reconhecendo a não hediondez do tráfico privilegiado, levaria à soltura de 45% das mulheres presas.
Vista
Diante da complexidade do tema e dos argumentos levantados no debates, o ministro Edson Fachin, que havia se manifestado pelo indeferimento do HC abrindo a divergência, pediu vista dos autos para uma melhor análise do caso.
Fonte: STF