Marcelo Girade Corrêa, diretor-executivo da
M9GC, atuou no Poder Judiciário por 21 anos. Recentemente, promoveu um curso de capacitação inédito junto aos profissionais do escritório de advocacia Dupont Spiller, em Bento Gonçalves, onde aprofundou temas como as razões pelas quais o cliente deve ou não optar pela mediação, o papel do mediador, os diversos contextos de atuação da advocacia na mediação e na conciliação e fundamentos da negociação produtiva, com destaque para o Método de Harvard de Negociação. Confira abaixo três perguntas sobre o tema.
Além de desafogar o Judiciário e da rapidez na resolução de impasses, que outras contribuições a Lei da Mediação deve trazer à sociedade? O Brasil está atrasado neste debate? Desafogar o Judiciário não é simples. Exige uma série de ações conjuntas que passam por aspectos relacionados à gestão eficiente, mudanças legislativas e, mais especificamente, a novas formas de resolver conflitos. Com a Lei, teremos o início de uma grande mudança que será sentida, efetivamente, somente daqui a cinco anos, quando os tribunais conseguirem se preparar de forma adequada lidar com essas demandas no aspecto quantitativo. Além da expectativa na redução do número de processos, a Lei de Mediação abre a possibilidade de uma mudança cultural da nossa sociedade quanto à forma como resolvemos nossos conflitos. Empresas, pessoas físicas e jurídicas em diversos contextos, inclusive no âmbito da Administração Pública, passarão a contar com uma estrutura legal que irá sustentar diversos programas e iniciativas relacionadas à resolução consensual de conflitos. Hoje, muitas disputas que estão nos tribunais não precisavam estar ocupando as prateleiras dos cartórios e tampouco as salas de audiência. Poderiam ter sido resolvidas, em uma primeira tentativa, dentro de ambientes cooperativos. Nesse aspecto, estamos atrasados quanto a este debate. Por outro lado, como o povo brasileiro é pacífico por natureza e pragmático por necessidade e vocação, temos a oportunidade de recuperar o tempo perdido em uma velocidade que pode surpreender.
No ano passado, quando entrou em discussão, a mediação foi alvo de críticas. O professor da USP Kazuo Watanabe, por exemplo, declarou que a mediação não deve ter o objetivo de desafogar o Judiciário, mas de mudar a cultura do litígio, reprovando assim a forma como a modalidade de solução de conflito vem sendo implementada no Brasil. O que o senhor pensa disto? Estaríamos, com essa lei, tomando uma medida que se resume apenas paliativa? O professor Kazuo Watanabe é um homem de grande visão. Ele foi o precursor de todas essas discussões no campo da resolução adequada de conflitos. Pelo que conheço de sua obra e de sua pessoa, o que o professor nos alerta é que nossas aspirações devem estar além dos objetivos intermediários. Temos que pensar grande e enxergar mais longe no horizonte. Desafogar o Judiciário é apenas uma das consequências de uma sociedade que passa a privilegiar a cultura da paz em detrimento da cultura do litígio. A Lei de Mediação, nesse aspecto, é apenas o meio que nos levará a uma nova realidade. Nossas ações deverão estar fortemente baseadas na adequada sensibilização e educação dos diversos atores que sustentam essa mudança. A preocupação do professor Kazuo Watanabe quanto ao que pode estar acontecendo nos tribunais é uma espécie de alerta. Se tratarmos a mediação como a conciliação foi e ainda é tratada nos Juizados Especiais, então teremos perdido uma grande oportunidade de mudança.
No curso ministrado pela M9GC, foram abordadas, por exemplo, as razões pelas quais o cliente deve ou não optar pela mediação. Quais seriam os casos em que é o cliente tem a ganhar optando por esse tipo de solução? É uma decisão que se refere apenas à magnitude do caso ou outras variáveis devem ser consideradas? No momento de tentar resolver uma disputa, o cliente, com a ajuda de seu advogado, deve avaliar alguns aspectos fundamentais. Se o cliente tem interesse em um processo que: a. Dê a ele a oportunidade de manter o controle sobre o resultado da disputa; b. Preserve ou aperfeiçoe uma relação continuada com o outro lado; c. Evite o estabelecimento de um precedente legal; d. Conduza a soluções criativas que vão além do que um tribunal pode oferecer; e. Produza um acordo duradouro; f. Preserve a confidencialidade; g. Economize tempo e dinheiro; h. Ponha um ponto final na disputa; e i. Aumente as chances de expandir ou ampliar os ganhos, então a mediação pode ser uma boa opção. É claro que não é necessário que todas essas variáveis estejam presentes. No entanto, se algumas delas forem suficientemente importantes para o cliente, é bem provável que a tentativa de resolver a disputa utilizando a mediação seja uma escolha mais apropriada.