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A responsabilidade civil do médico nos dias atuais

13/04/2016

O avanço da tecnologia na área da saúde está evoluindo com o objetivo de buscar a cura para diversas doenças e também para proporcionar melhoras no atendimento aos pacientes em casos de doenças terminais, conhecido como tratamento paliativo.

Com o advento das pesquisas científicas e a busca pela cura de diversas doenças, a profissão da medicina está passando por diversas transformações, figurando a pessoa do médico como principal agente na seara da saúde, seja ela pública ou particular.

Por este aspecto, surge a chamada responsabilidade civil do médico, a qual é cada vez mais avaliada pela legislação e jurisprudência, ou seja, decisões proferidas pelos Tribunais de Justiça do país e pelas Cortes Superiores de Justiça – Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal.

Veja-se que a relação entre médico e paciente é contratual e considerada como obrigação de meio pelo médico, e não de resultado, salvo em casos de cirurgias plásticas de natureza exclusivamente estética.

Neste ponto, verifica-se que a obrigação de meio é aquela em que o médico, sujeito passivo da obrigação, utiliza os seus conhecimentos, meios e técnicas para alcançar o melhor resultado possível pretendido sem, entretanto, se responsabilizar caso este não se produza.

Já a obrigação de resultado é verificada quando o sujeito passivo da obrigação não somente utiliza todos os seus meios, técnicas e conhecimentos necessários para a obtenção do resultado como também se responsabiliza caso este seja diverso do esperado. Com isso, o profissional responsável pelo cumprimento da obrigação só ficará isento da tarefa empregada quando alcançar o resultado almejado. O exemplo deste tipo de obrigação médica é uma exceção e somente pode ser aplicada nos casos de cirurgia plástica e de natureza exclusivamente estética.

Dessa forma, a obrigação e a responsabilidade estão ligadas a conduta do profissional, isto é, na hipótese de ocorrência de erro médico, gera-se a chamada responsabilidade subjetiva, ou seja, precisa ser provada e demonstrada, e para justificar o dever de indenizar ao paciente ou aos seus familiares impõe-se a demonstração da conduta ao menos culposa do profissional e do dano sofrido, bem como o nexo entre eles, numa relação de causa e consequência.

Destarte, sendo a atividade médica de meio e não de resultado, a simples alegação do dano, sem a presença dos demais pressupostos, não configura a culpa do profissional, sendo necessária a prova da negligência, imperícia ou imprudência.

A responsabilidade do médico, profissional liberal, é apurada, portanto, mediante a verificação da culpa, nas modalidades de negligência, imperícia e imprudência, na esteira do art. 14, § 4º, do Código de Defesa do Consumidor, cabendo a parte interessada comprovar os requisitos da responsabilidade civil, que são o ato ilícito culposo, o dano e o nexo causal entre o ato e o dano causado.

Para melhor compreensão far-se-á necessário explicar cada modalidade de culpa: a negligência pode ser considerada como a falta de cuidado ou de aplicação de uma determinada situação e é interpretada como se fosse um descuido. Exemplo é deixar de atender um paciente em estado grave de saúde sem justificativa para tanto.

A imperícia é identificada como uma falta de habilidade para a realização de uma atividade técnica ou até científica. Ocorre quando o médico realiza tratamento para o qual não está habilitado.

E a imprudência quando o médico realiza atos imprudentes ou não embasados em documentos científicos, como usar tratamentos experimentais em pacientes sem alertá-los do caráter experimental dos mesmos, ou então, prescrever medicação que não conhece, causando danos ao paciente.

Por sua vez, destaca-se que quando o médico presta o serviço na área da saúde pública, ele atua na condição de agente público e, por tal razão, não responde pelo chamado erro médico em vista da chamada teoria da dupla garantia, prevista na Constituição Federal de 1988, Art. 37, § 6º:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: [...] § 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

No caso concreto, o referido § 6º do art. 37 da Constituição da República consagra a dupla garantia, a qual é interpretada pelo ilustre Ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux: “Ademais, pontuo que esta Corte, em interpretação ao art. 37, § 6º, do texto constitucional, tem consagrado a teoria da dupla garantia, segundo a qual o referido preceito contempla duas garantias: uma em favor do particular, que poderá pleitear a indenização contra o Estado sem ter que provar a atuação dolosa ou culposa do agente público; outra em favor do agente público causador do dano, impedindo o particular de mover a ação de indenização diretamente em face do servidor público, o qual apenas poderá ser responsabilizado em posterior ação regressiva.” (Trecho extraído da decisão judicial proferida no Agravo Regimental na Ação Rescisória nº 2.388/MG, 07 de abril de 2015, em www.stf.jus.br)

Tal apontamento é de suma importância para os casos de discussão de erro médico envolvendo a área da saúde pública, sendo de inteira responsabilidade a prestadora de serviços públicos, como, por exemplo, o município e o Estado, cabendo a chamada “ação regressiva” pelo ente público em desfavor do médico, se for o caso, e quando comprovada a existência de erro médico.

Registra-se que, nos últimos anos, houve um acréscimo de ações judiciais movidas em face dos médicos. Em consulta ao site do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, www.tjrs.gov.br, pela busca “erro médico”, nota-se a quantidade de julgamentos e ações judiciais a respeito da matéria desde o ano de 1982 até agora, mês de abril de 2016. Segue relação:

Ano do julgamento e Número de Ações Judiciais

1982 (1) 1990 (5) 2000(43) 2010 (403)

1986 (2) 1991 (2) 2001 (45) 2011 (561)

1987 (2) 1992 (2) 2002 (53) 2012 (547)

1988 (1) 1993 (5) 2003 (50) 2013 (526)

1989 (3) 1994 (9) 2004 (75) 2014 (566)

1995 (7) 2005 (110) 2015 (649)

1996 (30) 2006 (115) 2016 (92)

1997 (17) 2007 (170)

1998 (24) 2008 (201)

1999 (41) 2009 (265)

Depreende-se que, nos últimos anos, ocorreu um aumento relevante de julgamento sobre a questão relacionada ao erro médico e pedido de dano moral. Porém, na maioria dos julgados o médico não responde por eventual ato ilícito, já que fica demonstrada a ausência da ilicitude e/ou a falta de provas para condenar o profissional da saúde.

A responsabilidade civil do médico, dessa forma, é pautada na culpa, dizendo-se subjetiva, conforme disposição do Código de Defesa do Consumidor. Com isso, entre o profissional e o paciente, estabelece-se uma obrigação de meio, sendo necessário o emprego de métodos adequados, atenção e zelo necessários, sem a garantia de cura.

O médico somente poderá ser responsabilizado quando agir de modo imprudente, negligente ou imperito, haja vista que a ciência médica não é exata, já que o significativo aumento das demandas judiciais acerca do tema demonstra a necessidade de maior informação, tanto por parte de médicos e de pacientes, sendo esta uma relação contratual, abrangendo confiança, diálogo e esclarecimento exaustivo e preciso, aplicando-se o princípio da boa-fé contratual.

O paciente tem todo o direito de conhecer os riscos e as consequências a que se encontra sujeito, ao passo que o médico tem o direito de se resguardar, inclusive com a elaboração de Termo de Consentimento.

Portanto, registra-se que o médico é considerado um amigo da saúde de qualquer paciente, sendo inclusive da família e da comunidade. É um profissional que consegue envolver os sentimentos e as expectativas, com o intuito de buscar e prevenir doenças refletindo na vida pessoal, familiar, profissional e social. O médico assume a responsabilidade de orientar, prevenir e buscar a recuperação da saúde, mas não tem a prerrogativa de confirmar ou dar a certeza da cura.

Ronaldo Emer Advogado - Dupont Spiller Advogados Associados Depto. Cível

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