As consequências da crise deflagrada pelas revelações sobre o rombo da Americanas terão desdobramentos, até agora invisíveis. Não se trata aqui de pessimismo ou de otimismo, mas dos efeitos naturais de um evento dessa magnitude. Depois do susto e dos impactos imediatos, surgirão novos riscos e oportunidades. Não será surpresa se, na abertura do ano legislativo, em Brasília, parlamentares fizerem fila para protocolar projetos recheados de promessas de moralização, transparência e controle, muitos bem-intencionados, mas de eficácia duvidosa.
A velocidade é importante. A pressa, não. Quando uma organização do tamanho da Americanas sofre um abalo gigantesco, vemos, logo, análises catastróficas, questionando e condenando os marcos legais existentes e as ferramentas de gestão utilizadas pelas empresas bem-sucedidas. Não foram a governança e as leis que falharam. Foi sua aplicação.
Como em quase todas as crises, essa nos oportunizará reflexões sobre melhorias e avanços, apesar da lastimável desagregação de valor. Um dos pontos a serem repensados é a atuação dos conselheiros e dos conselhos. A independência passará, com certeza, a ser mais valorizada e compreendida como um ativo e não como uma ameaça. Também a forma de atuar das empresas de auditoria, que cumprem um papel fundamental, será revista, com perspectivas de evolução inadiáveis.
Enquanto isso, as ondas de choque continuarão a espalhar seus efeitos. O mais nocivo deles é a degradação ainda maior de um ativo fundamental para o bom funcionamento da sociedade: a credibilidade. Trata-se de um fenômeno global na política, nas relações pessoais e de trabalho. Alcançou agora, aqui no Brasil, empresas e pessoas, até então, acima de qualquer suspeita. Mas também isso, se agirmos de forma enérgica e construtiva, passará. O saldo será, no fim, positivo, se soubermos, concreta e simbolicamente, lidar com o tombo bilionário.
* artigo originalmente publicado na Zero Hora, edição de 9 de fevereiro.