Um novo código ambiental para o Rio Grande do Sul foi sancionado pelo governador no dia 9 de janeiro de 2020. Aprovado pela Assembleia Legislativa em dezembro do 2019, atualiza e moderniza o anterior. Dentre as suas novidades, destacamos o Licenciamento por Adesão e Compromisso. Abreviadamente chamado LAC, é o procedimento de licenciamento para as atividades sem significativo potencial de impacto ambiental, não sujeitas a Estudo de Impacto Ambiental e respectivo Relatório de Impacto Ambiental (EIA-RIMA), que não convertam áreas de remanescentes de ambientes naturais nem intervenham em áreas de preservação permanente, que serão definidas pelo Conselho Estadual do Meio Ambiente (CONSEMA). No Rio Grande do Sul, até o surgimento do LAC, cada uma das três etapas do procedimento administrativo de obtenção era acompanhada pelos técnicos do órgão ambiental (Licença Prévia, Licença de Instalação e Licença de Operação), que emitiam a licença somente depois da análise dos projetos e dos impactos ambientais, geralmente sem obediência aos prazos. Vale lembrar, a licença ambiental é um ato do poder público que permite a localização, a concepção, a instalação, a operação, a alteração e a ampliação de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou daquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental, constituindo-se, assim, num requisito básico para o exercício da atividade econômica. Com o LAC feito online e sem as conhecidas amarras da lentidão da burocracia ambiental, as três etapas ocorrerão de uma só vez. A licença será única e imediatamente concedida quando preenchidos todos os requisitos previamente estabelecidos, tudo de modo eletrônico, pela internet, através do SOL, Sistema Online de Licenciamento Ambiental do Rio Grande do Sul. O empreendedor entra no sistema e firma a DAC, que é a Declaração de Adesão e Compromisso, pela qual aceita, adere e se compromete a cumprir os critérios, pré-condições, documentos, requisitos e condicionantes exigidos pela administração ambiental para a atividade que pretende licenciar, instruída com as informações técnicas necessárias sobre a instalação e operação do empreendimento, com a identificação e a caracterização dos seus impactos ambientais e das medidas preventivas, mitigadoras e compensatórias. A declaração e seus documentos são recebidos como expressões de verdade, dando ensejo ao licenciamento. Com a plataforma eletrônica fixando e definindo o rol das exigências ou condicionantes para o licenciamento procurado, espera-se que não mais ocorram os costumeiros “complementos” e os “complementos dos complementos”, exigências sem fim frequentemente feitas ao empreendedor pelo corpo técnico do órgão licenciador, que criam insegurança jurídica e altos e desnecessários custos de assessoramentos e estudos ambientais, arrastando o procedimento de licenciamento por vários meses ou anos e emperrando a livre iniciativa, a abertura de novos negócios e o desenvolvimento, inclusive ambiental do Rio Grande do Sul. Espera-se, também, que, a partir do LAC, pelo maior espaço de liberdade que concede ao empreendedor para o licenciamento da sua atividade, com a presunção de veracidade da declaração e dos documentos apresentados, a administração ambiental do Rio Grande do Sul promova efetiva fiscalização dos empreendimentos assim licenciados, numa atividade real preventiva-repressiva, tal qual a Receita Federal faz mediante malha das declarações do imposto de renda enviadas por seus contribuintes. Não se quer, com isso, confundir-se ou igualar-se os bens jurídicos em questão, arrecadação fiscal e ambiente. A lembrança é para exemplificar a atividade fiscalizatória permanente e eficiente que a Receita desempenha, que pode vir a ser também o padrão da administração ambiental. O novo Código prevê várias e importantes ações e medidas como expressões do exercício do poder de polícia: apreensão, embargo de obra ou de atividade e de suas respectivas áreas, suspensão de venda ou de fabricação de produto, suspensão parcial ou total de atividades, destruição ou inutilização dos produtos, dos subprodutos e dos instrumentos da infração, e a demolição. Aliás, aprimorar a atividade fiscalizatória do SISEPRA, Sistema Estadual de Proteção Ambiental formado pela SEMA, FEPAM, PATRAM e municípios, promover a infraestrutura necessária e qualificar os agentes da fiscalização são providências da política administrativa ambiental que faltam ao Rio Grande do Sul e ao Brasil, apesar dos melhores números da FEPAM em 2019 (mais de 4 mil vistorias e fiscalizações e redução do prazo do licenciamento em 48%), apresentados pelo governo estadual em seu sítio eletrônico. A qualificação dos instrumentos ambientais de fiscalização é providência fundamental para aumentar a eficiência das ações de proteção numa incessante busca de maximização. Os crimes ambientais que ocorrem nos quatro cantos do país e que nos deixam perplexos são muito mais pela falta de fiscalização eficiente sobre a existência de licenciamento, ou o cumprimento de suas condicionantes, do que pela previsão legal de um procedimento ágil de licenciamento de atividade sem significativo potencial de impacto ambiental, concedido ao empreendedor que voluntariamente busca a administração ambiental para, submetendo-se ao cumprimento das obrigações ambientais correspondentes, obter o licenciamento e estar em compliance ambiental, numa postura bem diversa daqueles que fogem do sistema estatal de proteção, fazendo-se moucos aos ditames de preservação. Aos críticos do LAC, nas suas premonições de que empreendedores irresponsáveis serão beneficiados por esta nova modalidade de licenciamento, porque lhes dará oportunidade para mentir, oportuno lembrar que, se o empreendedor elabora ou apresenta estudo, laudo ou relatório ambiental total ou parcialmente falso ou enganoso, inclusive por omissão, será responsabilizado por crime ambiental e poderá sofrer a imposição da pena de reclusão de 3 a 6 anos, além de expressiva multa. Para que se tenha ideia da severidade desta pena a quem fraudar no LAC, comparativamente com outros delitos ambientais, o crime de poluição, que consiste em causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora, tem pena mais branda, de 1 a 4 anos, mesmo quando a poluição torne uma área urbana ou rural imprópria para a ocupação humana, provoque a retirada, ainda que momentânea, dos habitantes das áreas por ela afetadas, torne necessária a interrupção do abastecimento público de água, dificulte ou impeça o uso público das praias ou tenha ocorrido por lançamento irregular de resíduos sólidos, líquidos ou gasosos, ou detritos, óleos ou substâncias oleosas, quando será de 1 a 5 anos. E, comparativamente outros crimes, como o de infanticídio e o homicídio culposo, delitos que atentam contra a vida humana, único bem de recuperação impossível, é também mais agravado. A pena mínima para o infanticídio, homicídio do recém-nascido pela própria mãe, é de 2 e não de 3 anos, e a máxima, para o homicídio culposo, é de 3 e não de 6 anos. Antes de impedir a modernização e a celeridade do procedimento de licenciamento pelo uso da internet, por causa de eventuais riscos que a irresponsabilidade criminosa de alguns possa acarretar, cabe ao Estado, como deveres unicamente seus, elaborar normas que prevejam procedimentos com clareza para diminuir as margens de interpretação, verificar a veracidade dos dados declarados e dos documentos apresentados no licenciamento e fiscalizar o cumprimento das obrigações ambientais pelos empreendedores, fazendo pleno uso do poder de polícia, de modo a que todos cumpram seu papel na obra conjunta de salvaguarda do equilíbrio ecológico. Não se justifica que milhares de procedimentos de licenciamento de atividades de menor impacto tramitem sem prazo pela burocracia ambiental como almas perdidas em busca de seus corpos.